terça-feira, 23 de junho de 2015

SANTO ANTONIO DE LISBOA


Dali é possível ver a ponte do centro de Florianópolis, iluminada bem ao fundo, parado abaixo dos guarda-sóis com luminárias de madeira. A água vem bater no cais e veem-se barcos e velas. Paredes de pedra sempre o deixaram extasiado. Como podem os noivos que casam ignorar que logo em breve farão parte do cenário do narrador. Um passeio no bistrô. Camila me chama para tirarmos uma foto. Não discuto se é justo cortar a minha introspecção. Não foi assim quando fui com Jaime e Cassandra na praia da Armação. Depois no Boni na Lagoa da Conceição. Cada natureza e companhia tem um êxtase próprio. Paramos na lápide com a inscrição de Santo Antonio de Lisboa. Fábio percebe que o único que pode proporcionar o prazer de cervejas e petiscos sou eu. Concordo, estou no êxtase e Camila reclama de fome. Lisandra que sempre soube persuadir diz que obrigará o nego a pagar. Não é para tanto. Serão só alguns noventa reais para desfrute. E sem eles estaria em casa. Lembramos ali no banquinho em volta a mesa de pedra que seria interessante se o meu pai voltasse a me visitar. Porra, aquela peixe assado com originais na praia do Forte com o velho foi demais. Sou o anfitrião e as visitas estão felizes. Conversamos que será interessante arrumar uns extras em Jurerê Internacional e eu penso em como tirar a arma do console para assaltar o primeiro burguês dali que não me permitir ficar na ilha. Bang Bang Shoot Shoot pilantra. Dessa vez não será como quando tive ainda dinheiro e não arrisquei até o ultimo cents em terras europeias. Isso ainda me dói. Dessa vez não saio tão fácil. O sorriso de Camila ao comer o pastelzinho, a alegria de Fábio a sorver mais um gole, e a reminiscência de Lisandra da sua lua de mel em Canasvieiras, tudo me indica que estou no caminho certo, dessa vez. Meus caros bahianos, é bom sair do Santinho. Poucos narrariam tanto em tão pouco. Alojamento não mais, vamos tentar é estar nas paredes de uma dessas galerias de arte. Pintados por um ousado observador. Sejamos resolutos. Todos se espantam quanto e quando pago. Lisandra estava fora, Fábio: “meu Deus”, Camila: “porque você não falou que eu tinha cartão”. Meus caros, não é isso de conta que vai me limitar permanecer na ilha. Sim seria deixar de me encantar com os delírios dos noivos saindo da igreja sem perceber que só o que preciso é encher o refil de realidade sem descartar a minha narrativa. A magia está em como se leva a realidade de ser pago sim por algo operacional, contanto com o extra que somente nós sabemos para observar o que os outros nem sacam. Santo Antonio de Lisboa, por hoje levei você comigo. Deixei Camila, Lisandra e Fábio por instantes. Voltamos a ver a ponte ao longe e rumamos para o terminal.  

 

Acantiza, 23 de junho de 2015.














 

segunda-feira, 22 de junho de 2015

NUMA BOA


Eram três da madrugada, Tomas estava assistindo um filme bizarro e Tito havia saído para encontrar uma gata e ia aproveitar para pegar dez reais em fumo com alguns dos traficantes que perambulavam ali na orla. Não ia sair muito da rotina, a coisa estava se armando como o de sempre, digo, a cerveja estava gelando na geladeira, e estávamos eu e Tomas degustando um Cabernet chileno em copos normais mesmo. Erik estava com Camila na suíte, deviam estar cochilando entre algum e outro papo no espanhol cantado de Camila. Eu saí para sacada, dali dava para ouvir as ondas quebrando na areia como de costume, enquanto Tomas ria alguma coisa assim:

-Esse filme é maneiro. Os caras estão pesquisando os filmes mais bizarros da internet, olha isso. O cara tem um saco no queixo.

Olhei e era verdade. Dei uma risada. Então recebi a mensagem de aviso no whatsapp, era Sandro, ele falou em inglês como costumávamos nos brindar:

-Hei body, we are heading to Santinho´s get some wine, beers and the ordinary alcolic cocktail of Fábio. You guys whant some more?

- No dude, everything is done. Just come fast. Eu respondi.

Fui e peguei uma cerveja em alegria da vinda dos caras. Erik saiu do quarto e perguntou se poderia se juntar no vinho. “É claro, meu caro”. Logo Camila se juntou a nós e sentou-se ajeitando-se no sofá, dividindo o pequeno espaço com Tomas.

Os caras tinham que chegar para a gente pedir as duas pizzas gigantes e uma doce. Eu optaria pelo lanche gigante feito por algum gaucho migrado para cá, na verdade. Mas tínhamos que escolher algo que comportasse no estômago e no bolso. Já era fim de mês e sabíamos que uns teriam que pagar mais que outros na conta, então caberia mais a pizza mesmo. O fato é que eram três da madruga e se não viessem em meia hora parariam as entregas. Aqui não era São Paulo ou Rio onde os deliveries são vinte quatro horas. Eu disse:

- Caras, vamos pedir o rango. Sandro e Fábio estão a caminho.

- Liga do meu, uma escarola com bacon, uma calabresa com cheddar e uma brigadeiro. Todos concordam, disse Tomas.

- Os caras tão ostentando, falou Erik. Mas quem sou eu para discordar desse menu. Só tou com o orçamento baixo.

- Eu pago hoje, amor. Falou Camila, em brazilian spanish colombian.

Ligamos. Ia demorar quarenta minutos. Os caras chegaram, avisou-nos o interfone. Todos ficaram na euforia, formamos realmente uma amizade, um time. Quando cruzaram a porta foi aquela saudação. Quando Fábio pôs o coquetel alcoólico na mesa foi aquele sarro. Alguém disse:

-Cortes no Orçamento.

- O nego nunca saiu dos cortes do orçamento, disse Tomas. Todos sorrimos.

Tito chegou e estava feliz com seu encontro. Colocou o fumo num pires e alguém começou separá-lo com uma faca. Ficamos mais felizes ainda com a chegada das pizzas gigantes. Foi um banquete dos Deuses, como de costume. Eu já não fumava mais maconha mais isso não era problema: a energia da galera era demais.

Perguntei então se mais alguém estava vendo as postagens de nossa antiga colega Suelen no facebook. Referia-me a ela ter se batizado evangélica e ultimamente estar postando um punhado de textos bíblicos. Sandro comentou finalizando aqui:

- Caras, isso vai até fazer bem para ela. Ela já não tem muito o emocional legal e só escolheu caras que não ajudaram muito nesse aspecto. Digo, todos que tinham menos que trinta anos. Deixa ela assim...

Tem sido realmente fantástico. E digo: isso é o mínimo do que posso ir dizendo. Há muito mais. Porém amanha é dia de ir a Santo Antonio de Lisboa, e quem sabe trabalhar numa galeria de artes.

 

Acantiza, 22 de junho de 2015.

sábado, 20 de junho de 2015

DA LITERATURA E DO PORQUE VOCÊ PODERIA PENSAR EM FORÇAR A SUA DEMISSÃO


DA LITERATURA E DO PORQUE VOCÊ PODERIA PENSAR EM FORÇAR A SUA DEMISSÃO

Você acha que alguma coisa te segura nessa posição que julga por existir como posse. Eu digo: quem é você? Pois eu vou dizer que nem posição e nem existência cabem no julgamento de ter qualquer oposição ao teu eu anterior. Quem julga é a sua consciência. Você tem que se aproximar disso ou alguém vai te tirar dela, de possuir, de ter vida. Cedo ou tarde acontece. Tiram-te a posição de segurança e isso é uma graça concedida, uma pérola entre ostras fechadas em si mesmas. Tiram-te. Se não for por um boçal aproveitador que atende como supervisor, vai ser por algo que chamam Deus. E será forte. Um baque. Você tem que desistir. A liberdade está na base da desistência de querer ser alguém para outros, ter um nome, ter um cargo. Nada disso é o seu eu anterior. Não faz qualquer e mínimo sentido no valor, na vitória final da morte. Você tem que resistir ao que dizem. Fazer de cada dia uma negação do fato que alguém domina seu direito de não ser como o outro. Ninguém domina a ignorância de querermos ser alguém. Nós já nascemos alguém.  A liberdade está no fato de você se negar um ser humano, pois ouve um antes. A liberdade é não querer ter qualquer posição fixa. A liberdade é enfiar um pau na boca de quem diz que a sua careira cabe somente a você. A sua carreira profissional é uma misera ilusão, criada pelos que lideram o jogo, ilusão de que você pode existir eternamente. Você é perecível como o idiota que julga tomar o seu destino. Você tem que escolher, ser capaz ou incapaz de não ser alguém. Eu fui incapaz. Eu me espelho no outro e construo um eu que costuma se frustrar. Seriam esses que percebem aqueles que mudam o mundo? Porque tenho a gana de mudança! Alguém me fez assim social e a cada renuncia minha eu me desfaço para ser a realidade que eu era antes de nascer. Meu eu anterior. Para que tenha valor o que você me diz, eu preciso primordialmente aceitar que eu fui um eu anterior. E o que sempre existiu antes foi algo como Deus. Depois as palavras. E agora a tua misera demissão se torna um nada imenso e uma brutal oportunidade de afirmar tudo que eu quero dizer. A volta ao que importa. Entender o que vale de verdade para me chamar alguém e, quando for a linha final, me entender alguém autêntico e levar isso comigo. Garçom é como vocês me viram, mas é como escritor que eu vou permanecer. Tem mais a ver com meu eu anterior. Meu próximo contrato poderia ser com uma editora, assim me polpa o título deste texto no próximo e demais contratos findando uma carreira da qual não faço questão alguma. Do diário eu vou às personagens. Nisso vocês me ajudaram. O resultado de um falso visionário é ser enganado, e tanto ele, quanto os que o enganam, são bons caracteres. Vindo em breve.

Acantiza, 20 junho 2015.