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A fotografia como informação
Por Augusto Cesar Cavalcanti de Souza
A fotografia como informação
Por Augusto Cesar Cavalcanti de Souza
A fotografia é uma das formas artísticas que foi grandemente contestada no que diz respeito ao seu valor de representação. Claramente ela foi de encontro a um meio artístico que não era acostumado a uma forma de reprodução tão concreta. Mas não foram somente as técnicas de reprodução que se viram confrontadas com a fotografia. Em seu ensaio sobre a reprodução mercanica, Walter Benjamin argumenta que a fotografia aprasaria o fim do próprio capitalismo, ao trasformar autencidade de um fato em bem de consumo.
Podemos entender que a fotografia causava impacto na sociedada antes mesmo de ser presenciada, como afirma Geoffrey Batchen (2) freqüentemente citada, mas raramente vista, a fotografia exercia uma presença alucinatória bem antes de sua invenção oficial.
Transpondo tal constatação para os meios de comunicação é correto citar a afirmação de Marchal Mcluhan quando expressa que o "meio é a mensagem, (o meio, ou veículo, é a mensagem)", afirmando que a luz elétrica é informação pura pelo fato de já nos transmitir um pensamento, informação sem ter um conteúdo informativo.
"Isto apenas significa que as conseqüências sociais e pessoais de qualquer meio - ou seja, de qualquer uma das extensões de nós mesmos - constituem o resultado do novo instalão produzidos em nossas vidas por uma nova tecnologia ou extensão de nós mesmos."(3)
A fotografia transforma o tempo em espaço e o espaço em tempo. A colocação foi bem argumentada por Roland Barthes, em Câmera Clara, que notou que a fotografia lhe dava uma idéia de morte, pois na imagem é gravada uma presença no tempo que não existirá mais. A fotografia, diz ele, nos proporciona um "isto será" e um "isto foi", em uma única e mesma representação(4).
Tal argumentação nos leva a entender a questão da unicidade e do valor tradicional de uma obra de arte propostos por Walter Benjamin, quando ele define aura como a aparição única de uma coisa e nos relata que se um objeto, alguma obra em geral, é retirada de seu contexto histórico, a mesma perde seu valor de representação.
"Mesmo na representação mais perfeita, um elemento está ausente: o aqui e agora da obra de arte, sua existência única no lugar em que ela se encontra. É nessa existência única, e somente nela, que se desdobra a historia da arte." (5)
Benjamin também nos lembra, ainda nessa mesma linha de pensamento, que essa desvalorização da aura é agravada pela nossa necessidade irresistível de possuir o objeto, de tão perto quanto possível na imagem, ou antes na sua cópia, na sua reprodução, fazendo com que cada vez mais se busque uma arte feita para ser reproduzida e que é tão trabalhada para que atinja o efeito no consumidor, tornando-se objeto de desejo, admiração ou repudio, que nos leve a um começo de pensamento, daí podermos concluir haver a possibilidades de criarmos uma informação para nós mesmos, mas que se não for novamente representada não será aceita como verdadeira.
Esses ensaios sobre fotografia mostram que, independente do fato de a fotografia ser ou não uma forma segura de comunicação, é seguro dizer que ela causa um impacto social e político na medida que percebemos que seu conteúdo é uma das coisas mais valorizadas em uma sociedade estabilizada na obtenção e consumismo. Nosso desejo se materializa na imagem.
A fotografia representa um momento de vida, de morte, uma paisagem que tinham um significado naquele instante, e fora desse instante não é provável que somente por meio de uma foto se consiga transmitir informação. Tal comunicação se torna possível com uma seqüência de fotos, que é o principio do cinema. A imagem estática, incomunicável tornasse parte de nosso mundo realizando um desejo de que a representação se funde cada vez mais com a obra única e completa, a vida.
O filme "BLOW-UP" representa a vida de um fotógrafo que não consegue se comunicar, e aí entendemos se comunicar como ser compreendido, se relacionar com pessoas e com ele mesmo. A incomunicabilidade é gerada por ele ter se habituado a um meio de comunicação representado por imagens, e ao aceitar a realidade da imagem, dissolve a separação entre real e imaginário, entre a imagem da coisa e a coisa em si.
"O homem não olha mais para um real a partir do qual vai criar determinadas imagens e das quais ele seria o seu referencial primeiro. Agora, o homem olha primeiro as imagens para depois compará-las com algo que ainda possui o nome de "real", mas que não tem mais o mesmo estatuto de realidade que possuía anteriormente". ( 6 )
O filme mostra uma inversão do referencial da realidade indo de encontro a nossa confusa realidade de existência. Tudo passa a existir e a ser verdade somente enquanto imagem. Ainda concluindo essa idéia, Paulo Menezes nos diz que ocorre uma inversão das palavras de Bazin sobre o surgimento da fotografia: "a fotografia se beneficia de uma transferência de realidade da coisa para sua reprodução".
Abaixo serão descritas cenas adaptadas do roteiro original de Michelangelo Antonioni que exemplificam uma forma de entender a fotografia como comunicação. O filme também pode servir de base para a discussão de outras proposições sobre os novos fundamentos da arte mostrados pelos pensadores citados anteriormente.
Seqüência dos mímicos na quadra de tênis
Thomas esta olhando pelo gramado. Os mímicos da seqüência inicial reaparecem em cima de um jipe. Eles param em uma quadra de tênis após dar uma volta em redor da mesma. Dois deles entram na quadra enquanto o resto se transforma em platéia. Agora todos estão em silencio.
Os mímicos que estão na quadra se movimentam e jogam através de gestos como se vissem raquetes e a bola. Seus movimentos são de um jogo real, com saques, disputas de ponto, é tudo muito bem representado. Thomas vai para um dos cantos da quadra e observa tudo aquilo em silêncio.
A câmera se volta para os rostos da platéia, que movimenta suas cabeças de um lado para o outro acompanhando o jogo e os movimentos daquela encenação. Em uma das jogadas, a bola imaginaria é atirada violentamente no alambrado. Todos se protegem assustados.
A câmera segue os movimentos de uma suposta bola pelo ar. Até que em uma jogada errada, a bola ultrapassa o alambrado. A câmera constrói esse movimento e constrói uma imagem que desce e que desliza pela grama até ir parando devagar, nos dando a sensação de não entender mais se existe ou não aquele objeto representado.
Thomas corre até a suposta bola, abaixa-se, pega e a joga duas vezes para cima e a joga de volta para quadra. Agora o movimento da bola é mostrado pelos olhos de Thomas que voltam a olhar para o jogo. Agora nós também ouvimos o barulho da bola que segue de um lado ao outro.
Não há uma revelação visual de que é um jogo, mas nos somos induzidos a pensar pelo movimento da câmera e das personagens, que realmente exista uma bola, raquetes, enfim buscando a realidade da imagem que já é uma realidade que estamos acostumados a aceitar como verdadeira.
Seqüência em que a modelo é fotografada
Thomas entra no estúdio. A modelo nos aparece através de uma imagem. Seu vestido é preto, com duas laterais abertas que deixam a vista toda a lateral nua de seu corpo insinuando-se através dele. O dialogo entre eles é curto e ríspido.
Após ele arrumar a roupa e literalmente analisar a modelo, pede a seu ajudante que coloque alguma musica. A musica é um jazz um tanto sensual. O fotógrafo começa então a tira fotos bem próximo a modelo. Entre as seqüências de fotos toma, um copo de vinho.
A modelo esta agora no chão. As falas do fotógrafo são ordens de como ela deve se comportar. O fotografo esta em volta dela e se mostra mais e mais exitado. Ele puxa seu cabelo para trás. Começa a se aproximar e acariciar o corpo dela. Pede então uma câmera que tem uma lente 50mm com capacidade de aproximar num campo maior o que se vê através dela. A câmera vai permitir uma aproximação melhor entre eles.
Thomas vai descendo sobre seu corpo até ajoelhar-se sobre ela e encaixar-se em seu ventre. Os movimentos do fotógrafo se tornam mais eufóricos. Ele fala coisas próximas ao ouvido dela que sorri insinuante, beija o pescoço dela, mais próximo, a câmera dispara fotos a todo momento como meio de união entre os dois, seus corpos movimentam-se juntos.
No final da sessão, numa representação máxima de exitação, o fotógrafo ajoelhado sobre ela grita eufórico: "Yes,Yes,Yes". O clímax é visual e inquestionável. A modelo continua deitada no chão extasiada com o que acabaram de fazer, passando a mão sobre o seu seio e exausta, está aí a representação visual do orgasmo.
A cena nos mostra uma metáfora de relação sexual mediada por uma câmera fotográfica. È o exemplo máximo da influência da imagem em um ser humano, a possibilidade de juntar a capacidade de penetração do meio fotográfico em realidade física e visual. É uma forma de mostrar a vulnerabilidade humana quanto essa inversão de valores entre realidade e imagem, mostrar a necessidade de obter uma coisa representada cada vez mais próxima, se possível poder toca-la, senti-la, é a necessidade de disfarçar uma vontade de poder criar uma realidade que possa ser controlada individualmente, montada por cada um de nós em que não haja necessidade de comunicação entre pessoas.