quarta-feira, 25 de novembro de 2009

A Disciplina do Enlouquecer

A disciplina do enlouquecer.

(Desligue a luz, por favor).


Peça em três partes.

Um homem de 25 á 30 anos está de volta ao Brasil depois uma viagem de um ano pela Irlanda e pela Itália. Ele resolve isolar-se. As aventuras, as desilusões, as amizades e os amores vividos nos são contados através de diálogos, onde não sabemos se as personagens são reais ou inventadas, contudo é a única forma que ele encontra de se expressar. Depois ele resolve escrever a lírica de uma peça cantada. Nenhuma das letras fala de nada específico da cultura desses países, mas sim a visão absurdamente subjetiva do homem. Compreendemos o quanto sensações descontroladas se tornam uma existência frágil quando algumas decisões burocráticas devem ser tomadas. Na idéia a peça é sobre aquilo que não muda: os seres humanos e sua condição limitada pelas regras dos espaços em que convivem. O espaço daquilo que se mistura com nossa compreensão subjetiva e daquilo que confronta com o que há de realidade. Ambos trazem limites. O entendimento final da personagem é que a compreensão disso o torna mais livre.

Na primeira parte é descrita a incapacidade do homem em descrever o que viveu. Seu grupo de familiares e amigos são pessoas de classe média que habitam numa cidade fundada por americanos na província brasileira. Um dia ele se acha mudo. Todos resolvem conviver com esse estranho comportamento, com receio que ele se afaste de novo, melhor que fique calado como está. Como se sua memória fosse se apagando, para ele só existe a banal existência atual e isso lhe causa uma temporal angústia porque se projetar para frente, ter planos, se torna impossível sem a vivência passada, mesmo se a mesma representa momentos desagradáveis. Ele começa primeiro escrever diálogos e diz que é o processo para conseguir re-existir. Começamos não saber se as falas das próprias personagens já apresentadas são invenções suas, pois se misturam com as novas personagens dos diálogos escritos em inglês e italiano, algumas vezes. Entramos num mundo de fantasia e realidade, caracterizado por uma atmosfera de sonho.

Na segunda parte o homem tenta compreender o porquê não fala e decide somente sair de seu quarto para comer. Ele faz relações filosóficas entre as palavras e seus sentidos. Será nossa compreensão mesma limitada por nosso vocabulário? De certo esse mundo maior acabe trazendo angustia e se torne uma projeção sem fim. Agora percebemos que realmente as personagens apresentadas são somente aquilo que ele concebe em sua imaginação. Sua única informação do mundo de fora são os anúncios de empregos de São Paulo / Capital e uma rádio de blues Italiana que escuta pela net. Os mesmos logo acabam se tornando base para novas criações que agora começam ser musicais pela influência da rádio. Compreendemos que existe um bom senso de organização da nova sociedade criada pelo cara. Seus familiares tornam-se mais sensatos de suas aspirações. Um novo limite é estabelecido. A nova perspectiva depende daquilo que o cara sintetizou como sua vida passada, e daquilo que ele almeja fosse à existência presente e futura. Um fim de caos começa. Não sabemos se as personagens mudaram de caráter ou se é somente a pretensão imaginada do homem.

Na última parte compreendemos a visão muito particular desse homem, que nos é descritas em uma partitura de músicas intitulada: “a disciplina do enlouquecer”. Suas personagens aparecem para cantar as líricas que representam suas vidas. Podemos perceber, na medida em que são interpretadas, que a complexidade de verdades contidas nas letras sobrepõem essa pessoas comuns na divisa do centro da existência, em saber o que elas realmente são, e no final todas tornam-se angustiadas, quase não conseguindo cantar os últimos versos. Ao mesmo tempo as letras mostram-nos a disciplina de um artista em se compreender e compreender aquilo que existe de concreto numa divisa um tanto arriscada dos espaços da realidade. Contudo, por não ter confiança suficiente naquilo que faz, a última cena nos mostra uma realidade desanimadora. O homem sai do isolamento, diz que foi chamado para uma vaga de emprego na grande metrópole, sua família lhe pergunta se ele esta contente com isso, o mesmo, trazendo consigo alguns escritos sobre a mesa, diz ser mais verdade do que aquilo tudo.

Percebemos nisso tudo que a estrutura de planejar uma carreira de emprego não faz mais parte das pretensões da juventude contemporânea, e que a verdade tem faces que por nos gerar angustia, deve ser mantida isolada.




Proposta de peça teatral constituída de prólogo e três partes.

Inspirada na obra Estado de Sítio de Albert Camus.

Estado de Camus

O prólogo da peça mostra o cotidiano de Camus, uma cidade média e fictícia onde, de modo aparentemente natural, ocorre uma queda de energia. O desagrado físico e mental trazidos pelo apago não causam mudanças na ordem rotineira Todos os egoístas cidadãos de Camus sempre mantiveram a privada vida regular. Favorecer o convívio entre as partes nunca representou vontade. Todos acreditam que é de extremo risco sair da cidade. Têm medo da suposta onda de calor, apesar de nunca a terem visto.

Na primeira parte a cidade de Camus começa existir nos noticiários. O apago novamente ocorre e O Estado, A lei e Os Gerentes das Igrejas desaparecem. Com a inexplicável queda da energia e seus poderes sumidos o cotidiano dos simples cidadãos vira caos. Ninguém consegue mais jogar o chamado “crescer dinheiro” e a imagem de Estado de Sítio, agora conhecida de fora, desagrada aos camunianos e não há mais animo para viver. O incomodo faz as personagens Camus e Existere discutirem idéias complexas de “existência” no lugar de poesia. A população torna-se confusa e todos temem a onda de calor. A angústia é geral. Camus, a personagem, vê nisso uma chance de reestruturação das regras no jogo e divide sua idéia com Existere, sua namorada, e com Angst, amigo de caráter duvidoso e pouco conhecimento. Ambos, como os outros cidadãos, preferem que a antiga estrutura retorne.

Na segunda parte criam-se poderes ao acaso, e descobre-se que mesmo que ninguém acredite na verdade dos mesmos, é melhor que se mantenha essa ordem. Todos voltam “crescer dinheiro” e retorna na cidade o alívio. Quando todos aparentam haver esquecido do mal, o apago ocorre e agora não existe o tabuleiro. Com o apago algumas pessoas tentam entender o que é o jogo. Algumas verdades começam aparecer o que torna impossível jogar. Os poderes tomam suas frágeis decisões em acordo com os acontecimentos. Ao Estado Novo não interessa de modo algum a popularidade do município e a investigação pode revelar supostas fraudes. Os Gerentes das Igrejas aproveitam o desconhecido para aumentar as dezenas de seitas. À Lei a desordem geral não é bem vista sendo que interessa a desordem concentrada. A população começa pensar em deixar a cidade, mas uma onda de calor os barra. È o temível aquecimento global. Surge o anúncio de que acidade está cercada. Quem diz é o novo governo da cidade, A Crise, que junto com A Secretária de Estado lhes dará as devidas instruções.

Na terceira parte a alternância de humores alegres e tristes são generalizados. A Crise pede que a Secretária delimite equilíbrio geral de comportamento. As personagens começam, em diálogo direto com o jovem Camus, cobrar a cura. Camus conversa com a secretária de Estado e é atingido pela onda de calor, mas antes que sucumba Existere o salva. A Crise e a Secretária de Estado propõem ao jovem Camus que ele possa sair da cidade com a condição da suposta liberdade de se esquecer completamente de quem ele foi até ali. É a primeira constatação do absurdo. Camus recusa e começa compreender sua verdadeira relação com Existere, filha da Lei, e não sabe mais se é possível o amor. Camus, em uma frágil situação, é contestado e dominado por Angst. No monologo do jovem Camus, enquanto ele compreende os limites inerentes à condição da existência, as personagens mostram as mais diversas transformações faciais e comportamentais em uma dança. Entendemos que Camus não era uma cidade real e sim a representação do estado físico e mental da personagem do jovem Camus, auferidos pelas sensações provocadas por seu entendimento sobre o absurdo do mundo. A personagem Camus, na tentativa de sair do jogo “crescer dinheiro” projeta o equilíbrio no namoro com Existere. È a segunda constatação do absurdo. A onda de calor acaba e a cidade fictícia está supostamente liberta. Os poderes retornam. O ultimo monólogo é de Angst e não nos encoraja crer que a harmonia será para sempre. . Camus entende não haver o conhecimento suficiente para estar fora das regras do jogo

Personagens:


A CRISE

A SECRETÁRIA DE ESTADO

A LEI

ANGST

CAMUS

EXISTERE

O ESTADO

OS GERENTES DAS IGREJAS




Partitura do exílio.
Augusto Cavalcanti.


E como lembra o sabiá que canta
sentindo o cheiro das penas num coco
sobre tua perna azeda, num bonde num canto.
Eles se esquecem, daqui ou de lá, mesmo!

Acorda o cara saudoso, por favor.
“Senhor, é sua parada” diz alguém.
Que nosso exílio non tem mais raiz no!

Se doutro lado da terra soubesse dos teus gostos...
...vai sumindo que não sobra nem a saudade e a cor.

Uma memória líquida se inventa, chame-a glória imediata!

E sem a memória não existe a saudade no exílio. Não existem padrões de relação.
Virando a esquina ou noutra terra vive alguém. Ali na casa do moinho.
Não faz referência à coisa alguma, mesmo!

Esse romantismo saudosista me enoja.
E nos faz esquecer do gosto limpo de ti, das coisas,
Do bonde, do elixir do que escorrega e nunca foi.


(junho 2009).

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